Afundados em dívidas, produtores de arroz pedem socorro

Após as enchentes que devastaram o estado em 2024 e as secas severas em anos anteriores, os produtores de arroz do Rio Grande do Sul, maior produtor do cereal no Brasil, estão pedindo socorro. Acumulam dívidas, não têm condições de arcar com os elevados custos de produção e encaram juros elevados para financiar a próxima safra. Esse conjunto desestimula a produção e pode agravar as perspectivas para a inflação de alimentos nos próximos anos.
A região oeste do estado, responsável por cerca de 25% de todo o arroz produzido no país, foi duramente afetada pela seca na safra 2022/23, o que elevou o endividamento dos agricultores e levou alguns deles à insolvência. Nem o bom preço da saca foi suficiente para reduzir os prejuízos, que aumentaram ainda mais com a catástrofe climática que atingiu o Rio Grande do Sul no ano passado.
O risco de desabastecimento após as enchentes históricas fez o preço do cereal subir e estimulou os produtores a investirem na safra 2024/25, mesmo com dívidas elevadas. A conta chegou agora: a safra será maior que a passada, mas a redução dos preços está causando perdas.
“A rizicultura hoje enfrenta uma queda de preços muito significativa, a ponto de os preços estarem situados abaixo do custo de produção. Ou seja, quem está vendendo hoje, em média, o faz com prejuízo”, afirma o economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio Luz.
Para ele, a grave situação financeira dos produtores de arroz também é reflexo da inação do governo. “Sem dúvida, os juros altos foram importantes. Mas a falta de ação do governo em socorrer os produtores nos momentos de crise e os retrocessos feitos no Seguro Rural e no Proagro explicam melhor que os juros a situação do setor”, declarou.
Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a safra 2024/25 de arroz está estimada em 12,1 milhões de toneladas, quase 15% maior que a do ciclo anterior. O avanço se deve ao aumento na área plantada – impulsionado pelas boas expectativas de comercialização no segundo semestre do ano passado, quando o preço da saca de arroz era maior que o atual – e da produtividade, cerca de 7% maior que a da safra passada.
Com a estimativa de uma boa safra neste ano, o preço da saca de arroz caiu, para alívio do consumidor. O produtor, porém, ficou com a fatura, porque não sabe como vai pagar as dívidas.
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Projeto no Senado propõe renegociação para quem teve perdas por eventos climáticos
Uma solução, no entendimento dos produtores, é a securitização. A proposta está sendo debatida no Senado Federal por meio do Projeto de Lei 320/2025, de autoria do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS). A proposta autoriza a renegociação de dívidas de produtores rurais que tiveram perdas por eventos climáticos a partir de 2021.
Nos termos do projeto de lei, “a renegociação será feita por meio da transformação das dívidas em títulos que terão o Tesouro Nacional como garantia, com condições especiais para pagamento e comercialização”.
“Não queremos nada de graça, queremos prazo para pagar as dívidas que foram acumuladas ao longo de cinco anos frustrados”, diz a produtora rural Luciane Agazzi.
Segundo ela, milhares de pessoas estão mobilizadas nas margens das principais rodovias do Rio Grande do Sul, entregando panfletos e explicando a situação dos produtores à população.
“Estamos fazendo esse movimento em todo o Rio Grande do Sul, mas poderia perfeitamente se expandir para outros estados, porque a proposta de securitização é em nível nacional. No momento, temos o Rio Grande do Sul pleiteando a securitização devido a essas frustrações mais consecutivas do estado”, diz Agazzi.
A Conab, por meio da assessoria de comunicação, informou que apoia o produtor rural por meio da Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) e do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) – iniciativas que buscam, entre outros objetivos, garantir um preço futuro da saca de arroz. A companhia não se manifestou sobre a proposta de securitização, vista como a melhor alternativa pelos agricultores.
Desânimo pode reduzir cultivo de arroz e elevar preços
De acordo com o presidente da Cooperativa Agrícola Uruguaiana Ltda (Caul), Ariosto de Macedo Pons Neto, o panorama da rizicultura no Brasil está deixando os produtores desanimados. Alguns estão buscando oportunidades em países vizinhos.
É o caso do engenheiro agrônomo Tiago Rios Fagundes, que decidiu ir para o Paraguai diante do cenário desafiador brasileiro, mas acabou retornando porque lá as condições também não são ideais. “Hoje aguardo um cenário mais favorável para voltar a investir no setor, já que não vejo perspectivas animadoras de longo prazo na cultura”, diz.
A preocupação do setor é que esse desânimo dos produtores provoque novas altas do produto no futuro, já que há uma tendência de diminuição da área plantada com as condições atuais, pressionando ainda mais a inflação dos alimentos.
“Se o produtor não tiver renda, ele vai quebrar — e todos nós vamos depender de um arroz importado de qualidade inferior e, muitas vezes, com preço superior ao nosso”, afirma Pons Neto, da Caul.