José Márcio Camargo: alta do IOF é 1º passo para fechar conta de capital

A surpresa positiva com o tamanho do congelamento de gastos anunciado pelo governo nesta quinta-feira (22) foi ofuscada, segundo economistas ouvidos pelo WW, pela confirmação da elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Segundo José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos, “essa taxação significa um primeiro passo no sentido de fechar a conta de capital novamente no Brasil”.
O governo anunciou as alterações no IOF sob o argumento de harmonizar a relação entre a política fiscal e monetária, buscando, por exemplo, fechar brechas de evasão fiscal por meio do uso de planos de previdência, uniformizar alíquotas e afastar assimetrias e distorções, gerando maior neutralidade tributária e contribuição para redução da volatilidade cambial.
Para tal, a equipe econômica elevou:
- Para 5% o IOF sobre aportes mensais superiores a R$ 50 mil em planos de seguro de vida com cobertura por sobrevivência;
- A tributação sobre cooperativas tomadoras de crédito com operações superiores a R$ 100 milhões/ano, que serão tributadas como as empresas em geral;
- O crédito para pessoa jurídica;
- O crédito para empresas do Simples Nacional;
- Para 3,5% o IOF sobre remessas de recursos para contas do contribuinte brasileiro no exterior e compra de moeda em espécie;
- Para 3,5% o IOF sobre transferências relativas a aplicações de fundos no exterior;
- Para 3,5% o IOF sobre operações não especificadas de saída de recursos.
A elevação do IOF é a nona alta de impostos deste terceiro mandato de Lula. Camargo foi enfático ao apontar a medida como “uma lambança muito grande”.
Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, ressaltou outro problema quanto à medida que, além de “cheirar como controle de capitais”, também pode resultar no imbróglio de usar um tributo regulatório com propósito arrecadatório.
Em um documento chamado “Medida de Equilíbrio fiscal”, no qual o governo destrincha a medida, a expectativa apontada é de um impacto arrecadatório de R$ 20,5 bilhões em 2025 e de R$ 41 bilhões em 2026.
“Pode ser judicializado, e aí não resolve grandes coisas pelo risco de não concretizar”, pontuou Mendes.
Trajetória da dívida pública
Camargo e Mendes destacam como um ponto positivo do anúncio desta quinta a aproximação das estimativas do governo com os cálculos do mercado.
O pesquisador do Insper reforça, porém, que esse “realismo ainda não está completo, quadro é preocupante”. Entre os pontos que lhe chamam atenção estão uma possível subestimação dos gastos com o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Programa Pé-de-Meia operando fora do orçamento.
Sua estimativa é de que o resultado primário pode ser de um déficit de R$ 125 bilhões no fim, o equivalente a 1% do Produto Interno Bruto (PIB). Mendes salienta que para estabilizar a trajetória da dívida pública o Brasil precisa de um superávit fiscal de 2% do PIB, ou seja, precisaria recuperar um espaço de três pontos percentuais.
“A gente segue um processo que se repete no tempo: faz politicas inconsistentes, entra numa crise danada, aceita algumas reformas, sai da crise aguda mas não consegue estabelecer uma estabilidade fiscal. Hoje, o arcabouço fiscal que não se sustenta […], perdemos a oportunidade de lidar com regras fiscais”, pondera o economista.
“A situação está ficando bastante perigosa em questão de trajetória da dívida”, conclui.
Camargo ressalta que a dívida não deve parar de crescer e que a perspectiva não é positiva para o médio prazo.
“Vai ter um problema complicado. […] Passamos por uma situação muito próxima do desequilíbrio [com desvalorização do câmbio, juros e inflação subindo] e o governo continua insistindo na trajetória de aumentar gastos”, pontua.